7.11.06

A Esfinge

O vento sopra em seus cabelos, que se misturam à boca entreaberta, quase sedutora. Os lábios estão secos. Ela olha e nada vê. Não consegue mais distinguir entre os carros e as pessoas, pensando que realmente deve estar louca. Pensa que talvez por isso nunca a tenham compreendido. Talvez por isso as pessoas lhe pareçam mais complicadas do que verdadeiramente são. Para ela, o mundo sempre lhe foi uma esfinge. Os beijos e os abraços sempre foram frágeis, ao ponto de, num simples sopro do destino, acabar com amizades de anos, ditas “feitas para durar”. Nesse momento – pensa ela agora – “finalmente estou só”. Ela já não precisa mais da companhia de ninguém. Aliás, não-estar-sozinha sempre foi algo que ela sempre quis, mas que nunca teve. Ela está usando a mesma roupa da sua festinha de quinze anos: um vestido simples, cheio de babados, lantejoulas e esperanças rasgadas. Lembra-se perfeitamente da sua mãe fazendo um esforço enorme para provar de que tudo estava bem naquele dia. De que tudo estava como a novela das oito que ela “não perdia por nada nesse mundo”. No entanto, seu pai já não era mais o mesmo, sua irmã era magra e problemática e seu irmão, bom, esse só Deus sabia onde estava. Parecia uma família feliz. Realmente parecia. É incrível como agora as coisas passam rápido pela mente dessa garota. Ela pode até se lembrar do primeiro dia de aula, que outrora fez questão de esquecer. Tinha dezessete anos completados no mês anterior. Não tinha idéia na cabeça, não tinha crença num futuro. Foi quando, de repente, ela olhou para o lado e viu um menino moreno, de cabelos ondulados. Nada de especial, é bem verdade. O que a conquistou foram os olhos daquele menino, tão sinceros e transparentes. Foi assim que ela conheceu a paixão. Pela primeira vez o mundo lhe pareceu mais bonito, mais vivo e – porque não dizer? – mais convidativo. Teve medo. Sentimentos assim eram raros para ela e, exatamente por isso, resolveu dizer “não”. Já havia dito essa palavra outras vezes na vida, mas naquele momento era bem mais doloroso dizê-lo. Optou por abrir mão da sua felicidade e repetia num tom baixinho e monocórdio, tipo de confissão: “o medo é mais forte do que eu”. Pronto! Fim dos devaneios! A garota olha para o céu e vê as estrelas acima de sua cabeça. As luzes estrelares já não lhe parecem sem sentido, e agora elas passam uma sensação de caminho, como um destino que não se pode mudar, como um trem que não se pode parar. Ela sabe que é chegada a hora. Levanta os braços trêmulos e deixa o seu corpo na forma de cruz, num sinal evidente de adeus a um mundo que jamais conseguira entender, decifrar. É quando a menina descobre que a esfinge era ela mesma. Foi-se. Para nunca mais voltar. Lá em baixo as pessoas se perguntavam: “como pôde uma menina tão linda fazer uma coisa dessas?”. A resposta é que se pode ver a beleza que está na cara, mas jamais se pode ver a tristeza que está no coração.