As notas deslizam pelas teclas e dançam animadamente pelo piano, parecem brincar com os meus dedos nervosos. Já não estão mais separadas. A harmonia delas me contagia. Toco sem virtuosismos, porque não quero chamar atenção. Afinal de contas, a música é só minha. Minha forma de expressar com ressonância o meu protesto. Em minha mente as notas caem como pingos d’água em um lago profundo e obscuro. Desse jeito eu consigo me perder no espaço delimitado e cúbico em que me encontro. Já perdi a noção do tempo. Afinal, “tempo” é apenas um detalhe que eu insisto em esquecer, mas já a memória... Essa eu resisto até o fim, pois vejo que em tempos como este, de sobressaltos e soluços, tantas músicas são esquecidas, tantos versos apagados... Sou um produto da sensibilidade que a música me deu. Tenho um ouvido sensível que, quase sempre, consegue perceber razões sem nexo, ideologias sem fundamento. É nessa hora que perco a censura, e a música, antes baixa e discreta, ressoa por todo o quarto fazendo as teias de aranha balançarem e o chão vibrar. Soa como um grito de socorro. Recuso-me a desaparecer na poeira que sobe dos dias agitados! Prometo, Sofia, que vou continuar esperando pelos dias musicais que você uma vez ousou sonhar! O dia em que conseguiremos juntar as notas dissonantes e cantar, num canto uníssono, a harmonia que só a paz pode ter. Por enquanto, simplesmente toco. Ainda que já não ouça mais a melodia que sai do meu piano. Lá fora, as bombas ecoam fundo pelo ar.
Arrebentando com sempre Bruninho!!!
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